quinta-feira, 14 de abril de 2011

08 de Outubro Atriz Norma Benguel é sequestrada e espancada e solta no Rio de Janeiro

A seguir segue trechos da entrevista da atriz: 

Ricardo Kotscho: Nessa época mais ou menos do Roda Viva, da peça [de teatro] Roda Viva [escrita em 1967, estreou no Rio de Janeiro em 1968] do [músico e escritor] Chico Buarque, que houve esse seqüestro com você, não é?
Norma Bengell: Eu fui seqüestrada aqui no Teatro de Arena [em São Paulo, fundado em 1953], eu fui seqüestrada e espero que não seja hoje também. Eu fui seqüestrada aqui no Teatro de Arena porque eu tinha dado uma declaração sobre o aeroporto do Galeão, e a rádio Gazeta botou no ar. E aí me seqüestraram para saber sei lá quem era eu, e aí fizeram aquelas perguntas. Quer dizer, na realidade, eu acho que o meu trabalho de atriz nunca foi muito valorizado no Brasil, e sim as minhas posições político-libertárias, e também nem tão revolucionária eu sou assim, eu não sou nada, eu sou uma pessoa que reclama os meus direitos.
Ricardo Kotscho: De Roda Viva, da peça em que aconteceu esse seqüestro, para o Roda Viva de hoje, deste programa, o que é que mudou no Brasil, Norma? De Roda Viva a Roda Viva . Hoje dá para falar sem medo?
Norma Bengell: Olha, eu sempre falei sem medo, eu nunca tive medo de ninguém. Minha mãe dizia que, se eu fosse homem, graças a Deus que eu não tinha nascido homem, porque senão eu ia ser barra-pesada. Porque a mamãe conotava homem com revólver e com morte. Quer dizer, a geração dela, eu já não conoto mais assim. Mas eu acho que a ditadura criou uma geração que está precisando ser informada. Principalmente no Rio de Janeiro, aqui em São Paulo não sei muito, porque eu não vivo aqui, mas no Rio de Janeiro eu acho que essa geração tem que ser informada. Nós temos que contar a história verdadeira do Brasil, porque eles foram enganados durante vinte anos.
Norma Bengell: Olha, eu sempre falei sem medo, eu nunca tive medo de ninguém. Minha mãe dizia que, se eu fosse homem, graças a Deus que eu não tinha nascido homem, porque senão eu ia ser barra-pesada. Porque a mamãe conotava homem com revólver e com morte. Quer dizer, a geração dela, eu já não conoto mais assim. Mas eu acho que a ditadura criou uma geração que está precisando ser informada. Principalmente no Rio de Janeiro, aqui em São Paulo não sei muito, porque eu não vivo aqui, mas no Rio de Janeiro eu acho que essa geração tem que ser informada. Nós temos que contar a história verdadeira do Brasil, porque eles foram enganados durante vinte anos.
Norma Bengell: Olha, eu espero que sim, mas eu acho que a Constituinte é meio conservadora.
Luiz Fernando Emediato: Norma, você tem orgulho ou tem vergonha de viver neste Brasil de hoje?Norma Bengell: Às vezes eu tenho orgulho e às vezes eu morro de vergonha.Luiz Fernando Emediato: E tem vergonha por quê?Norma Bengell: Porque, quando eu ando na rua, eu vejo um país de mendigos. É um país de pedintes, todo mundo pede, não é? Eles pedem na rua, coitados, porque não têm como sobreviver; é um país reacionário, não é? Não é um país humano, do jeito que o povo está sendo tratado; e eles pedem pela televisão. Eles pedem, pedem, pedem, porque eu acho que os nossos governantes... mas não é de agora, muitos que nós tivemos... eu nasci durante o [governo de] Getúlio [Vargas], eu nasci em 35. Então, eu acho que o Brasil é um país mal governado e o povo mesmo não sabe ainda reivindicar os direitos dele. Agora que está... tem [Luiz Inácio] Lula [da Silva], tem mil pessoas aí berrando, mas o povo brasileiro é muito dócil, ele fica dizendo: Deus dará, Padre Cícero dá. Não, vamos respeitar o padre Cícero e Deus, mas se você não for à luta, ninguém vai lhe dar nada. Eu acho que também não adianta só dizer assim: os governantes e os governantes, porque fica aí uma coisa meio paternalista. Eu acho que a gente tem que ir lá ganhar o que a gente quer também. Eu morro de vergonha de ver essas crianças na rua pedindo, é velho pedindo, é racismo. Você não tem vergonha? 
Luiz Fernando Emediato: Às vezes sim, mas a entrevistada é você.
Ricardo Kotscho: Na época da ditadura militar, na época do seu exílio, o grande sonho de quem estava fora do Brasil era voltar para o Brasil, e hoje, na Nova República, o grande sonho da classe média brasileira, segundo todas as pesquisas publicadas recentemente, é ir embora do Brasil. O que aconteceu nesse meio-tempo?
[Aparece uma charge de Paulo Caruso em que Norma Bengell é representada, de costas, nua, com cabelos ruivos longos e com grandes e coloridas asas de borboleta. Descalça, deixa pegadas por onde passa.]
Norma Bengell: Eu acho que são os problemas econômicos, mas eu sou contra isso. Eu fui amiga de um homem chamado Alain Aptiekman, que era filho de um exilado russo, e que era um exilado russo bem-sucedido, economicamente bem-sucedido. E ele, antes de morrer, ele disse para o Allan: por pior que esteja o seu país, nunca emigre, porque tem uma palavra que se chama estrangeiro; você é uma pessoa estranha, não é? Então, eu acho que a gente tem que lutar aqui mesmo, viu?

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